domingo, 7 de fevereiro de 2010

DICA DE LIVRO: "A FORMAÇÃO DAS ALMAS", de José Murilo de Carvalho

Cenário: passagem do império para a República. Personagens: liberais, jacobinos e positivistas. Trama central: disputa pela legitimação do regime republicano. Com esses elementos, o cientista político e historiador José Murilo de carvalho constrói um trabalho fundamental para a compreensão de um momento importante da história política brasileira que, entre outras virtudes, agrada tanto o leitor especializado como o público mais amplo.
Não é a primeira vez que o autor se detém sobre o momento de gênese da República brasileira. Em estudo anterior, Os bestializados: o Rio de Janeiro e a República que não foi (Companhia das Letras, 1987), José Murilo coloca seu foco sobre a concepção e a prática da cidadania no Brasil, mostrando como o povo esteve afastado da “ onda revolucionária” de 1896. Tal evidência, longe de significar o final de um percurso analítico, anuncia novos desdobramentos: diante da inexpressiva participação popular, como o novo regime se consolida? A formação das almas: o imaginário da República no Brasil tenta responder a essa questão, a partir do mapeamento das correntes ideológicas que disputavam a definição da natureza do regime republicano.
Se o eixo articulador do livro – a trama das ideologias – é por si interessante, o modo como o sensível pesquisador procede a análise constitui, talvez, o aspectos mais original da obra. Trabalhando os elementos extradiscursivos das justificativas ideológicas republicanas, o autor, um hermeneuta das formas, interpreta símbolos, imagens, alegorias e mitos da época, na tentativa de avaliar como as visões da República transbordaram o círculo restrito das elites e atingiram a população de modo geral.
O título é revelador: formar almas. Eis o objetivo do arsenal de heróis, hinos, mitos e bandeiras que assolaram o país no final do século em meio a verdadeira batalhas pela conquista do imaginário popular republicano. Mas se a “República não foi”, tampouco conseguir construir um imaginário próprio. O farto material iconográfico analisado – monumentos, caricaturas de jornais, obras de artes – reflete as fraturas da República brasileira, do mesmo modo que Tiradentes, resgatado como uma espécie de “Cristo cívico”, é emblemático da inexistência de uma identidade republicana, do caráter inconcluso de nossa República. (Retirado do próprio livro A Formação das Almas, de José Murilo de Carvalho).


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